Há algum tempo atrás registrei a imagem de um casal de
João-de-barro. Os dois pássaros haviam construído seu ninho com terra molhada e
capim, para a reprodução; a chamada casa do João-de-barro. A árvore, um Tamboril, não resistiu ao tempo
e já não existe mais.
O casal de João-de-barro. Imagem: Cláudio J Gontijo/Lassance-MG |
Mais um período depois e ouvi sons estranhos que vinham
exatamente do ponto onde as aves haviam mantido a sua prole. Eram piados
repetitivos, numa sequência quase hipnótica. Já era noite alta, escura, de lua
crescente. Fui até a árvore, a poucos metros da varanda e foquei a lanterna na
casa de barro. Tive uma surpresa. Na pequena porta de entrada uma outra ave se
mostrava. Não era quem deveria estar ali.
Disparei a máquina, buscando o foco no clarão efetuado pela
lanterna. Ainda surpreso, lembrei-me de que o João-de-barro não costuma
reutilizar o seu ninho. Sua opção natural é pela partilha. Enquanto seus ninhos
resistem às intempéries, podem ser utilizados por outras espécies de pássaros.
Mas o que fazia ali uma Coruja-do-Campo? Ave de rapina, que costuma arquitetar seu
ninho em buracos no chão, por isso são também chamadas de Corujas-buraqueiras.
A figura estava lá, estática, à entrada do ninho. Parecia uma rolha, obstruindo
a porta da casinha de barro.
Na mesma casa, à noite, a coruja na porta de entrada. Imagem: Cláudio J Gontijo/Lassance-MG |
A ave predadora teria invadido o ninho de outra espécie em
busca de pequenos ovos e filhotes ? Ou estaria naquele local para a reprodução
?
Quando lembro-me daquela Coruja em seu estranho ninho, a
partilha é um dos pensamentos que me ocorrem. Nestas várias reflexões, fica
também a vontade de rever amigos distantes. Muitos deles de temperamentos
difusos. Mas de muitas histórias comuns, de trocas, barganhas e alegria.
Personagens de encontros e desencontros, como aqueles pássaros, espécies
diferentes, de hábitos alimentares contrários, mas de histórias afins,
propiciadas pela necessidade de sobrevivência, na grande comunhão
ecossistêmica.
É que a proximidade e a convivência são pilares que vão
solidificando os valores de toda uma existência. Uma vida em comum que modifica
e edifica, que apara as diferenças e promove o crescimento. Uma jornada que se
torna mais rica, para afastar o vazio e as arestas, para promover a vida plena
e verdadeira. A exemplo da Coruja e do João-de-barro. Tão diferentes, mas tão
próximos.
4 comentários:
CARO AMIGO, ENCANTOU-ME SUA POSTAGEM! AFLOROU SUA SENSIBILIDADE E FALOU BONITO! QUE BOM FOI CONHECE-LO E PODER USUFRUIR DOS SEUS CONHECIMENTOS DA SUA COMPETÊNCIA E DA SUA AMIZADE!
Passando para agradecer a visita ao Arte de educar, gostei muito do conteúdo do blog,uma ótima semana!
A convivência, Circele, ainda que virtual, mas cercada pela sensibilidade, faz com que compartilhemos os espaços. Obrigado pela sua boa amizade.
Obrigado, Aise. Que o blog Arte de Educar continue sempre vivo e generoso.
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